Envolvida desde a origem do Fórum
Social Mundial, em 2001, em Porto Alegre, a Vida Brasil sempre participou dos
encontros que reuniam o movimento social de todo o mundo. Em 2013, a Vida
Brasil coordenou junto com a CONEN (Coordenação Nacional de Entidades Negras) o projeto baiano que garantiu a participação da delegação no
FSM que, tal como em 2015, foi realizado em Túnis, na Tunísia.
Como o processo de construção do Fórum
não se resume apenas aos encontros bianuais, a Vida Brasil vem participando
continuamente das atividades relacionadas, como os Fóruns temáticos, além de
seminários locais que seguem a agenda internacional. O envolvimento da Vida
Brasil com o Fórum Social Mundial ocorre desde 2000, antes mesmo da primeira
edição do evento, que foi realizado em Porto Alegre, em 2001. Em todas as outras
edições, a Vida Brasil também participou ativamente na mobilização e
articulação dos movimentos sociais no Brasil e no exterior.
Damien Hazard coordenando a mesa "Democracias" |
Em 2004, a Vida Brasil fez a
coordenação política do Fórum Social Baiano e em 2007 participou da coordenação
executiva do Fórum Social Nordestino. O envolvimento com a organização e
construção do FSM, fez com que a Vida Brasil fosse uma das pioneiras a pautar a
acessibilidade do evento e o estímulo à inclusão de pessoas com deficiência
dentro do Fórum. Resultado disso, foi que em 2015 o FSM contou pela primeira
vez com uma Comissão de Inclusão, destinada a pensar as questões de acessibilidade
durante o encontro.
Em 2015, a Vida Brasil participou mais
uma vez do Fórum Social Mundial, desde a fase de mobilização, até a presença em
Túnis. Representaram a Vida Brasil: Damien Hazard (coordenador), Islândia Costa
(coordenadora do programa de Acessibilidade), Alex Hercog (assessor de
Comunicação) e Alessandra Costa (administrativo). Além de associados e
associadas: Ametista Nunes (Grupo Tortura Nunca Mais), Wilson Cruz (COCAS e
Abadef) e Maria Helena (Apalba).
Ametista Nunes, recitando o poema "Estatuto do Homem" (Thiago de Mello), abrindo os trabalhos da Casa Brasil no Fórum Social Mundial. |
Integrando o Coletivo Baiano/FSM, a
Vida Brasil colaborou com a atividade “Água é Vida”, que durante o FSM discutiu
o acesso aos recursos e bens naturais.
Já Damien Hazard, que também é membro
do Conselho Internacional do Fórum, representando a Abong (Associação
Brasileira de ONGs), era um dos coordenadores da Delegação Brasileira. Facilitou a mesa, na Casa Brasil, que debateu Democracias no mundo, além
de participar da concepção das atividades que discutiam o enfrentamento ao
racismo e Agenda Pós-2015. Damien também participou da coletiva de imprensa de
lançamento do FSM, da organização da marcha de abertura e colaborou com a
assembléia dos movimentos sociais.
E no último dia do Fórum, a Vida
Brasil realizou a atividade Desafios dos
movimentos para implementação de políticas inclusivas e de acessibilidade. A
roda de diálogo contou com a presença de 25 pessoas, dentre as quais o angolano
Memória Ekulica (FORDU), a professora tunisiana Naur Rebai, e pessoas com ou
sem deficiência do Brasil e da Tunísia.
Oficina promovida pela Vida Brasil, que discutiu acessibilidade e políticas inclusivas |
A atividade propiciou a troca de
diversas experiências, a partir de relatos pessoais e institucionais sobre
questões ligadas à acessibilidade e garantia de direitos, sobretudo no Brasil e
na Tunísia. Uma das participantes, a tunisiana Hend Ajam, se interessou pela
atividade, mesmo sem pertencer a nenhuma organização, nem ter atuação no
movimento social. Ela, que é cadeirante e hoje cursa o doutorado, se formou em
Ciências Contábeis e durante todo o período universitário teve que subir as
escadas carregada, muitas vezes ajudada pelo pai (que também participou da
oficina), pois a faculdade não dispunha de acessibilidade, nem de salas no
térreo. Hend Ajam quis participar da atividade “para conhecer como se passa a
vida de outras pessoas com deficiência fora da Tunísia”.
Para Islândia Costa, a participação e
depoimento de Hend foi um dos destaques da atividade: “Sei que mudamos algo
nela e em nós também”. De acordo com Islândia, são encontros como esse que
contribuem para a construção de práticas transformadoras. Para ela, se a
passagem da Vida Brasil em Túnis “fizer com que a jovem cadeirante faça
reflexões sobre como melhorar a realidade de outras pessoas em condições iguais
ou menos favoráveis que a dela” já seria uma grande vitória.
Wilson Cruz, Hend Ajam e Islândia Costa, durante atividade de Acessibilidade |
Mas o encontro também foi marcado por
contradições. Naur Rebai, que tem deficiência visual e pertence a uma
organização tunisiana que trabalha com crianças cegas, se queixou da presença
de pessoas ditas “normais” durante a atividade. Para ela, as problemáticas
vividas pelas pessoas com deficiência só poderiam ser discutidas com a
participação exclusiva de pessoas com deficiência. Essa discordância fez com
que ela se retirasse da atividade antes de seu término.
Para Maria Helena, da Apalba
(Associação de Pessoas com Albinismo na Bahia), foi justamente a amplitude da
discussão que fez a atividade ser interessante. Maria Helena diz que não
identificou nenhuma pessoa com albinismo durante o Fórum, o que fez dela a
única albina presente. “Já pensou se eu só pudesse discutir albinismo com
albinos? Eu iria conversar com as paredes.” – afirma, discordando que pessoas
com deficiências só possam falar entre si. Para ela, “o que me fez ser visível
durante a discussão foi justamente a presença de pessoas que estavam do meu
lado, para apoiar a minha causa, mesmo não sendo albinas”.
Maria Helena (Apalba) |
Maria Helena também lembrou que
qualquer pessoa pode adquirir uma deficiência, ficando cega ou cadeirante, o
que faz com que as discussões ligadas à acessibilidade e conquista de direitos
sejam amplas. Segundo ela, “o que falta é o preparo para saber lidar com a
diversidade. Se queremos uma sociedade inclusiva para todos, por que vamos
excluir?”.
O sociólogo Memória Ekulica também
trouxe suas experiências em Angola. Segundo ele, os movimentos sociais do país
ainda encontram dificuldade para avançar na conquista de leis que garantam
direitos às pessoas com deficiência. De acordo com Memória, apenas os segmentos
mais mobilizados e fortalecidos é que conseguem obter algumas vitórias,
enquanto os demais ficam à margem do processo.
O pai de Hend Ajam (esq.), Memória Ekulica e Naur Rebai (dir.) |
Para Wilson Cruz, da COCAS (Comissão
Civil de Acessibilidade de Salvador) e da Abadef (Associação Baiana dos
Deficientes Físicos), essa situação que ocorre em Angola lhe chamou a atenção.
Ele destaca a necessidade de se realizar parcerias com os movimentos sociais
angolanos, para trocar algumas experiências brasileiras que podem contribuir na
luta por direitos ligados à acessibilidade. Como sugestão, Wilson propôs
durante a atividade, que os diversos segmentos do movimento angolano de pessoas
com deficiência se juntem e elaborem uma carta única para ser apresentada ao
poder público, apontando os problemas e indicando soluções.
Além das atividades e composições de
mesa, a Vida Brasil também participou como ouvinte de diversas atividades. Alex
Hercog, assessor de comunicação, destacou alguns debates importantes que
ocorreram durante os cinco dias do evento, como o Fórum Parlamentar Mundial,
que trouxe parlamentares progressistas de países como Grécia, Espanha e
Argentina, discutindo temáticas convergentes, como o papel das nações mundiais
para reconhecer o Estado Palestino; além da mesa que discutiu a dívida pública
como instrumento de colonização, sobretudo em países latino-americanos,
africanos e em algumas nações européias mais fragilizadas pela crise
capitalista recente.
Alex Hercog (Vida Brasil) em um stand de um grupo tunisiano de cinema independente |
Alex também destacou a realização do
Fórum Mundial de Mídia Livre, que reuniu contribuições internacionais na luta
global e nacional pelo direito à comunicação. No entanto, segundo ele, a
experiência no Fórum não se resumiu apenas às atividades e mesas de debate,
“muitas vezes prejudicadas pela desorganização do evento”, por isso “caminhar
pela universidade, de stand em stand, conversando com diversas pessoas, de
diversos países e de diversos segmentos de luta, foi uma experiência única”.
Para ele, o intercâmbio e a diversidade proporcionados pelo Fórum é uma das
maiores virtudes do evento.
Já Alessandra Costa destacou as mesas
que discutiam o racismo no Brasil e no mundo, como a realizada na Casa Brasil.
Ela cita a fala do estadunidense James Early (Instituto Smithsoniam) que apontou
a necessidade do movimento negro do mundo inteiro atuar em convergência. Para
Alessandra, a participação no FSM foi enriquecedora – “Foi o meu primeiro Fórum
internacional. Pude quebrar alguns paradigmas locais, indo para um encontro de
maior abrangência”. Para ela, o Fórum Social Mundial foi provocador: “Voltei
cheia de conflitos”.
"O FSM alimenta a chama de esperança por um novo mundo possível" |
Para Damien Hazard, o FSM 2015
fortaleceu o papel da Vida Brasil como organização capaz de atuar na
articulação com outras entidades internacionais. Para ele, o Fórum também é um
espaço de formação que, apesar das dificuldades do encontro “todas as pessoas
da Vida Brasil voltaram impactadas pelo Fórum, em sua formação política,
cultural e humana”. Para Damien, o FSM “alimenta a chama de esperança por um
novo mundo possível”.
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