Agosto
é um dos principais meses do ano para se discutir a educação básica das
crianças e adolescentes no país. São diversas datas oportunas para se travar o
debate e realizar ações, a exemplo do Dia do Estudante (11/08), Dia da Infância
(24), Dia Nacional da Educação Infantil (25), além do Dia Nacional dos Direitos
Humanos, comemorado no último 12 de agosto.
Considerando
os princípios fundamentais da declaração dos Direitos Humanos, foi que em 1990
se instituiu o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Portanto, em 2015 o
ECA completou 25 anos de existência. Essa data tão simbólica poderia ser usada
para se discutir medidas que garantam à criança e ao adolescente o direito à
Educação, com “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”,
como prevê o artigo 53 do ECA. Também no Estatuto se discutem as medidas socioeducativas
que devem ser aplicadas às crianças e adolescentes condenadas por algum crime.
Projeto Buscapé: discutindo os princípios do ECA e Direitos Humanos nas escolas públicas |
No
entanto, o que se percebe é que a sociedade brasileira vem num processo
crescente de desvalorização e até enfrentamento dos princípios
defendidos pelo ECA e pela própria declaração dos Direitos Humanos. A
desinformação é um dos principais fatores para deturpar esses instrumentos,
muitas vezes bloqueando o debate ao sentenciar que tais documentos servem para
“defender bandido”. Esse preconceito e indisposição ao debate permite que
pautas retrógradas avancem no país. É o caso do projeto de lei que prevê a redução
da maioridade penal para 16 anos.
É
nítido que a proposta de redução tem mais objetivos político-partidários do
que, de fato, combater a violência no Brasil. É tendência mundial que a idade
mínima seja de 18 anos. Até mesmo em países como os Estados Unidos, em que
alguns estados, como Texas e Nova York, possuem maioridade de 16 anos, já estão
avançando projetos de leis defendendo a ampliação da maioridade. Ou seja,
países de todos os continentes do mundo defendem a idade mínima de 18 anos,
enquanto que outros, que passaram pela experiência de redução, estão voltando
atrás.
O
Brasil, infelizmente, anda na contramão do mundo, acreditando que trancafiar
pessoas de 16 e 17 anos no mesmo presídio que adultos e privados de receber
medidas socioeducativas específicas, dentro de um sistema prisional que já se
revela falido, vai reduzir a violência. O mundo provou que não, mas a ausência
de debate por aqui permite que cada vez mais pessoas apoiem a redução.
Vida Brasil participando do ato Contra a Redução da Maioridade Penal |
E
enquanto o debate nacional se limita à pauta da redução, o país perde a
oportunidade de discutir outras ações mais oportunas no combate à violência. A
educação, por exemplo. A realidade cotidiana tem revelado que as escolas estão
cada vez mais desprestigiadas e que a competição com o mundo fora dos muros da escola
está cada vez mais desleal. Além disso, sobretudo as crianças e adolescentes da
periferia vivem em um contexto de exclusão de diversos direitos fundamentais,
como moradia digna, acesso a bens e serviços públicos e culturais, acesso a
transporte público e de qualidade, que acabam influenciando sua formação, o
afastando cada vez mais do processo educativo e lhe aproximando do universo do
crime, vislumbrados pelo poder e riqueza que o tráfico de drogas finge ofertar.
E
a mesma Câmara dos Deputados que avança no projeto de redução é a mesma que em
julho rejeitou a oferta do ensino médio obrigatório nas prisões.
Reduzir
a redução da maioridade penal e negar os princípios do ECA e dos Direitos
Humanos não reduz a violência. Ao contrário, tende a aumentar. E quem paga por
isso, inclusive com a própria vida, é a população mais pobre, sobretudo as
crianças e adolescentes negras. A quem interessa, então, a redução da
maioridade penal?
Oportunamente,
agosto também é significativo para o movimento negro, que promove diversas
atividades de combate ao racismo durante o mês, além da realização da marcha mundial
contra o genocídio da população negra. Por ser esse o segmento que mais sofre
com a violência, é que a pauta da redução está diretamente ligada às pautas do
movimento negro, de quem a Vida Brasil sempre atuou como parceira e continua
colaborando com as ações realizadas por diversas entidades.
Vida Brasil participando da aula pública com estudantes da rede pública sobre a "Revolta dos Búzios", atividade do "Agosto Negro", promovido pela CONEN. |
Portanto,
além de ser contrária à redução, a Vida Brasil segue tentando contribuir com a
alteração desse cenário de violência sofrido pela sociedade, sobretudo pela
população negra. Além de incidir politicamente e defender os Direitos Humanos
para todos e todas – e não apenas para quem possui dinheiro e poder – a Vida
Brasil acredita na valorização da educação das crianças e adolescentes.
Há
19 anos a Vida Brasil trabalha no projeto Buscapé, se valendo da arte e da
educação para contribuir na formação de jovens; defende o programa de
acessibilidade e educação inclusiva; promove o intercâmbio com grupos de outros
países, a exemplo do Malagasy, grupo cultural composto por meninas de
Madagascar e que foi recebido pela Vida Brasil em 2014; e busca incidir
politicamente, como na participação em atos contra a redução da maioridade
penal, organizado pela Frente Estadual Contra a Redução; no apoio ao ICS
(Instituto Cidadania Suburbana) para a realização do seminário “Subúrbio debate
a PEC 171”; além da atuação em conselhos, a exemplo do Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e dos Adolescentes.
Malagasy, grupo cultural do Madagascar, participando de um intercâmbio em Salvador, apoiado pela Vida Brasil. |
Dessa
forma, a Vida Brasil aproveita o mês de agosto, significativo para quem luta
pelo direito à educação das crianças e adolescentes, para novamente se
posicionar contrária à redução da maioridade penal, e a favor de programas que
valorizem a educação dos nossos jovens.
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