segunda-feira, 7 de julho de 2014

Vida Brasil na Guiné Bissau

Por: Damien Hazard

Na semana de 8 a 13 de junho 2014, Damien Hazard, da coordenação da Vida Brasil, esteve em Bissau, capital da Guiné Bissau, como representante da direção executiva da Abong – Associação Brasileira de ONGs, para participar de encontros com organizações da sociedade civil deste país africano.

Foto da fachada azul colonial da Casa dos Direitos
em Guiné Bissau.


O convite partiu da organização portuguesa ACEP e da Casa de Direitos, uma rede guineense de organizações da sociedade civil que estava comemorando o seu segundo aniversário. Damien foi palestrante num seminário realizado na sede da Casa de Direitos, no dia 10 de junho, quando apresentou as experiências de redes brasileiras e mais especialmente da Abong.

Fotografia aérea de parede sendo pintada com ilustraçoes
de cenas do cotidiano da antiga presão para jovens.
Situada ao sul do Senegal, no litoral atlântico do Oeste africano, a Guiné Bissau é parte da CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa), junto com o Brasil, Portugal, Timor leste, e na África o Moçambique, Angola, São Tomé e Príncipe, e Cabo Verde. Possui uma população de cerca de 1,6 milhão de habitantes, sendo cerca de um quarto na capital, Bissau. Em 2012, o país sofreu um golpe militar. No mês passado, eleições democráticas foram realizadas e os militares perderam o poder nas urnas, devendo entregá-lo no mês de julho para um novo governo. Essa mudança de regime cria grandes expectativas para toda população assim como para todas as organizações da sociedade civil. Por causa do golpe, os movimentos sociais enfrentam um relativo isolamento nos últimos anos.

O evento realizado na Casa dos Direitos, intitulado “Da emergência das ONG as redes colaborativas, experiências da Guine Bissau e do Brasil” teve como objetivo a troca de experiências, a reflexão e aprendizagem conjuntas na perspectiva da articulação dos movimentos e ONGs da Guiné Bissau e de maior incidência nas questões de desenvolvimento, dos direitos humanos e da cidadania participativa. Inicialmente, foram resgatadas as experiências de articulações da sociedade civil na Guiné Bissau:
Fotografia da sala onde foi realizado o evento. Mesa de abertura
composta por 3 pessoas, entre elas o representante da Vida Brasil,
  • a Solidami nos anos 80 após a independência do país;
  •   a Placon-GB (plataforma de ONGs de Guine Bissau) que foi criada em 2000 num contexto de pós-conflito, chegou a ser membro do FIP (Fórum Internacional de Plataformas Nacionais de ONGs, do qual a Abong faz parte) mas desapareceu nos últimos anos;
  • a Rede de solidariedade, que surgiu de forma espontânea no início desta década e reuniu organizações nacionais e internacionais para tentar se posicionar frente ao novo regime no país.

O país também conta hoje com redes temáticas, voltadas por exemplo para segurança alimentar ou para o monitoramento da exploração de recursos naturais. Foi citado o caso da exploração predatória e retirada de madeiras, por empresas notadamente chinesas, com o apoio de membros do atual governo.

Apesar do contexto político nacional delicado, a sociedade civil da Guiné Bissau demonstra riqueza e dinamismo. Dentre as organizações, devem ser citadas a Liga Guineense de Direitos Humanos, fundada há 22 anos, e que publicou recentemente uma pesquisa intitulada “40 anos de impunidade”. Ou ainda a Ação Cidadã, movimento mais recente, formado principalmente por jovens (apesar deles não quererem dar essa conotação ao movimento): a Ação Cidadã pode ser enxergada como um desses novos movimentos que surgiram nos últimos anos em diversos países e que buscam novas formas de atuação e de organização, em prol de uma democracia mais direta e de uma maior horizontalidade na representação. Assim como os estudantes do Chile, os indignados da Espanha, Y´en a marre do Senegal, Occupy nos Estados Unidos e no Canadá, ou ainda os movimentos revolucionários de juventude da África do Norte.

Fotografia da sala do seminario, com explanaçao do
representante da Vida Brasil, Damien Hazard.
A experiência brasileira suscitou um grande interesse. Damien apresentou a diversidade da sociedade civil brasileira através de diversos olhares, estatísticos, históricos e políticos, para chegar a uma reflexão sobre o papel das organizações e suas estratégias de incidência política num contexto em evolução caracterizado pelas disputas ideológicas, econômicas e políticas. Descreveu o percurso histórico da Abong, desde sua criação em 1991 até os dias atuais, com as mudanças contextuais, políticas e estruturais que a caracterizaram.

No debate que seguiu, organizações guineenses questionaram a política atual de cooperação brasileira, e criticaram a atuação do Brasil, com a ação de grandes empresas brasileiras, notadamente da construção civil, da mineração e do agronegócio, e seu efeito nefasto sobre os direitos humanos das populações locais. Um caso emblemático é o programa Prosavana, em Moçambique. Foi ressaltada a necessidade de maior articulação entre os movimentos sociais guineenses, africanos e brasileiros.


Fotografia do lançamento com varias pessoas
conversando e a parede pintada com ilustrações
do cotidiano da prisão ao fundo.
O seminário foi encerrado com o lançamento de uma exposição de fotografias do moçambicano Mauro Pinto, e de um livro sobre a história do espaço da Casa de Direitos. A sede da Casa de Direitos é uma antiga prisão para crianças e adolescentes em conflito com a lei. Nas paredes internas, jovens pintaram cenas da história do lugar, para melhor valorizar a memória do lugar, mas também expressar a resistência do povo guineense e das suas organizações representativas. As belas e trágicas fotos do jovem e renomado fotógrafo Mauro revelaram a solidão de outras crianças, lá de Moçambique, presas em uma prisão e em um hospital psiquiátrico.

Fotografia do representante da Vida Brasil
com os membros da Federaçao das Associaçoes
de defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiencia
 FADPD GB
Damien aproveitou os dois dias seguintes para encontrar organizações, e mais especificamente de pessoas com deficiência, depois de um convite no encontro na Casa dos Direitos. No dia 11 de junho, reuniu-se com membros da FADPD/GB (Federação das Associações de Defesa e Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência): a presidenta Filomena de Barros Said Sá, os representantes de organizações de pessoas com deficiência física (Spencer Gomes), de cegos (Augusto Simão) e de surdos (José Augusto Lopes). Algumas pessoas já conheciam o trabalho da Vida Brasil. De forma geral, as organizações demonstraram interesse em estreitar as relações com organizações brasileiras. Um primeiro encontro virtual deve ser realizado.

Fotografia do representante da Vida Brasil com representantes
da Associação de Surdos de Guiné Bissau
No dia 12, Damien visitou a AS-GB (Associação de Surdos de Guiné Bissau) e a escola para surdos. Criada em 2000 e legalizada em 2005, a AS-GB visa a inclusão social de pessoas com deficiência visual através da sua capacitação e formação na área do ensino especial. A escola para crianças e adolescentes surdos está inserida numa escola pública, mas apresenta condições precárias de funcionamento. Em seguida, Damien visitou e impressionou-se com a nova sede da escola e da associação. Concebida com requisitos de acessibilidade, a sede estende-se numa área de cerca de 7.000 m². O projeto prevê a educação de centenas de crianças e adolescentes. Assim como os representantes da Federação, a AS-GB manifestou interesse pela aproximação com organizações brasileiras de surdos. A AS-GB contribuiu diretamente para o surgimento de uma “língua gestual guineense” que em muitos aspectos difere da Libras- Língua Brasileira de Sinais. José Augusto Lopes explica que a língua gestual guineense foi concebida levantando sinais usados por surdos das diversas regiões do país. Como muitas palavras não tinham sinais correspondentes, crianças surdas foram reunidas e definiram os sinais. É o caso do sinal atribuído à palavra Brasil. Em vez de uma mão aberta descendo tremendo que representa a bandeira do Brasil, como na Libras, o sinal atribuído ao Brasil é do polegar puxando de dentro para fora os dois dentes da frente  (incisivos do maxilar superior). Uma lembrança aos dentes de Ronaldinho Gaúcho.


terça-feira, 3 de junho de 2014

18 anos de muita história... 18 años y muchas historias...18 ans et beaucoup d'histoires...18 years and many stories

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Descrição da imagem: ilustração colorida em fundo preto contendo vários rostos de homens, mulheres, crianças, indígenas, pessoas com deficiência visual, entre outras, representando a diversidade humana. Fim da descrição.
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Descripción de la imagen: ilustración en colores sobre un fondo negro, que contiene varios rostros de hombres, mujeres, niños, indígenas, personas con discapacidad visual, entre otros, que representan la diversidad humana. Final de la descriptión.
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Description de l´image: illustration coloriée en fond noir contenant plusieurs visages d´hommes, de femmes, d´enfants, de personnes indigènes, de personnes avec un handicap visuel, entre autres, représentant ainsi la diversité humaine. Fin de la description.
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Image description: color illustration on black background containing various faces of men, women, children, indigenous people, people with visual disabilities, among others, representing human diversity. End of description.


18 anos de muita história...

No dia 03 de junho de 1996 nascia a Vida Brasil. Sua missão: valorizar e fortalecer, por meio da educação e da participação, indivíduos e grupos socialmente vulneráveis e excluídos, contribuindo para a construção de uma sociedade sustentável, inclusiva e democrática. A organização completa hoje 18 anos. São 18 anos de muita história, muitas conquistas, realizações e de luta em defesa dos direitos humanos.

Ao longo dos próximos meses, preparamos algumas ações e contamos com a sua presença. Em breve divulgaremos a data e o local da seção especial que faremos na Câmara de Vereadores de Salvador para comemorar os nossos 18 anos. Comemore essa trajetória com a gente! Registre aqui seu depoimento!

18 años y muchas historias...

El día 03 de Junio del ano 1996 nació Vida Brasil. Su meta: valorizar y fortalecer por medio de la educación y de la participación, los individuos y grupos socialmente vulnerables y excluidos, contribuyendo a la construcción de una sociedad sostenible, inclusiva y democrática. La organización cumple hoy 18 años. Son 18 años de mucha historia, muchos logros y mucha lucha para la defensa de los derechos humanos. 

En los próximos meses vamos a preparar algunas acciones y esperamos contar con su presencia. En breve divulgaremos la data y el lugar de la sesión especial que haremos en la "Câmara Municipal de Salvador" para celebrar nuestros 18 años. Celebremos esta trayectoria juntos ! Participe, dejando su testimonio aquí !

18 ans et beaucoup d'histoires...

Le 3 juin 1996 est née Vida Brasil. Sa mission : valoriser et renforcer, par le biais de l’éducation et de la participation citoyenne, les individus ou groupes socialement vulnérables et exclus, en contribuant ainsi à la construction d’une société durable, inclusive et démocratique. L’organisation fête aujourd’hui ses 18 ans. 18 années d’histoires, de conquêtes, de réalisations e de  lutte en défense des droits humains.

Nous avons préparé plusieurs évènements durant les prochains mois et nous comptons sur votre présence! Nous communiquerons très prochainement la date et le lieu de la session spéciale que nous organiserons au siège du Conseil Municipal de Salvador pour la commémoration de nos 18 ans.
Venez célébrer cette histoire avec nous ! Participez et laissez un témoignage!

18 years and many stories

The 3rd june 1996 was born Vida Brasil. His mission : value and strengthen, by the education and participation way, individuals and groups who are socially vulnerable or excluded, so by contributing to the construction of a sustentable, including and democratic society. The organization is now celebrating its 18 years old. That’s 18 years of history, conquests and fulfillment in the fight and defense of human rights. 

We prepared several events for next months, so we count on your presence! We’ll communicate you dates and place of special session that we are organizing within the "Câmara Municipal de Salvador" for our 18 years celebration. Let’s come to celebrate our history with us! Participate by your testimony!

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Assine a petição por um novo Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil


Prezadas Associadas,

A Plataforma por um Novo Marco Regulatório para as Organizações da Sociedade Civil (OSCs) lançou uma petição on-line pela aprovação do Projeto de Lei 7168/2014. É o momento da sociedade civil organizada se unir para mostrar sua força e mobilização! O PL propõe avanços significativos na garantia de segurança jurídica e transparência para a sociedade civil brasileira nos contratos com o poder público e é um passo importante na construção de um marco regulatório que favoreça a atuação das organizações.

O abaixo-assinado está construído na plataforma Avaaz, partindo de uma estratégia de divulgação do tema nas redes sociais para mobilizar organizações e cidadãos na luta por um marco regulatório que reconheça o valor imprescindível do exercício da cidadania ativa e consolidação da democracia brasileira. Compartilhem com outras organizações e ativistas! Enviem para suas listas de email e compartilhem em suas redes sociais! O Marco Regulatório é luta conjunta de toda sociedade civil organizada!

> CLIQUE AQUI PARA ASSINAR A PETIÇÃO E APOIAR AS OSCs BRASILEIRAS

quarta-feira, 23 de abril de 2014

A educação em Itaparica e no Brasil: estatísticas que ocultam mais do que revelam

Artigo originalmente publicado no "ICAE Virtual Seminar: Education Post 2015"
Por Alex Hercog
Assessor de Comunicação / Relações Públicas da Associação Vida Brasil

A educação em Itaparica e no Brasil: estatísticas que ocultam mais do que revelam

Escola e suas ilhas de desafios
Ilha de Itaparica, município de Vera Cruz, Bahia, Brasil. Para chegar até lá, partindo de Salvador, é preciso atravessar de lancha a Baía de Todos os Santos, o que leva cerca de 50 minutos. Desembarcando em Mar Grande, é necessário seguir de automóvel por mais alguns minutos para, enfim, se chegar a uma de suas praias, cujo nome manterei em sigilo por questões éticas.

No final de 2013 estive em uma escola pública estadual dessa praia, na Ilha de Itaparica, com uma vista privilegiada para um infinito mar da costa. Na entrada, os estudantes pintavam o muro com desenhos e trechos de poesia. Fui bem recepcionado e, no final, tive a oportunidade de conversar em particular com a diretora.

Não demorou muito para a fala da professora se transformar em lamentação, se queixando da falta de recursos ou do mau uso dos investimentos. Ela admitia que o nível de instrução de parte dos alunos não era satisfatório, até mesmo para os que já estavam em séries mais avançadas. Segundo ela, muitos estudantes chegavam ao ensino médio sem saber escrever direito ou resolver problemas simples de matemática.

Mesmo sem ter condições de cursar determinadas séries, os alunos eram aprovados. De um lado, a pressão do Governo do Estado, que assedia os colégios: a aprovação evita a necessidade de abrir novas vagas, além da economia de um ano de custos com o aluno. Do outro lado, a própria complacência da escola, que acredita que é melhor o jovem concluir os estudos – mesmo com déficit de aprendizado – do que ser reprovado e, provavelmente, abandonar o colégio.

Para muitos desses jovens, a escola é o único suporte que eles têm. De condições sociais precárias, boa parte tem se envolvido com o tráfico de drogas. Meninos de 13, 14, 15 anos em diante, estão abrindo mão dos estudos, seduzidos pelas promessas do tráfico: dinheiro, respeito e proteção de sua turma, além do status desejado por qualquer jovem e que é viabilizado pelo dinheiro advindo da venda de drogas. Entre o trabalho no tráfico com suas vantagens a curto prazo e os estudos, muitos têm escolhido a primeira opção.

Com poucas possibilidades de agir, a escola cumpre o seu papel e convoca os familiares dos meninos que se encontram nessa situação para comunicá-los – de forma sutil, para não causar constrangimento. Segundo a diretora do colégio: “entra por um ouvido e sai pelo outro”. Se referindo à reação dos pais.

Antes de qualquer conclusão premeditada, ela justificou. Essas famílias vivem em condição de pobreza. São pais e filhos que muitas vezes vivem com um salário mínimo ou auxílios governamentais como o “Bolsa Família”. De repente, os pais presenciam o filho chegar em casa trazendo um quilo de feijão, arroz, carne, leite. Enfim, com produtos básicos que eles dependem. Qual seria a reação de um pai e de uma mãe? Recusar? A emergência da situação é preenchida com o imediatismo que o dinheiro do tráfico proporciona. Os pais fingem que não sabem de nada. E os filhos se distanciam cada vez mais do ambiente escolar. Reprová-los seria a solução? Para a escola, não. É melhor que esse jovem tenha um diploma de formação e a possibilidade de acolhimento no colégio, do que agir com o rigor e acabar por afastá-lo ainda mais. A escola se mostra impotente diante dos rumos de parte de seus alunos. Por isso, se não consegue resolver, ao menos tenta reduzir os danos causados pelo caminho que o jovem aceitou percorrer. Essa é a situação da escola localizada em uma das praias da Ilha de Itaparica, de acordo com o relato de sua diretora.

Evasão escolar, investimentos e qualidade de ensino no Brasil
De acordo com o Relatório de Desenvolvimento 2012, publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o Brasil possui uma taxa de evasão escolar de 24,3%. Na América Latina, só fica à frente de Guatemala (35,2%) e Nicarágua (51,6%). Dos que abandonam a escola, 93,75% pertencem à rede pública de ensino.

Em relação à taxa de analfabetismo, o número de jovens acima dos 15 anos, que não concluiu a alfabetização caiu de 12,4% em 2001 para 8,7% em 2012, de acordo com o IBGE. Ainda analisando alguns dados, pode se destacar o fato de que o Brasil é um dos países do mundo que mais aumentou seu investimento em educação. Entre 2005 e 2009, os gastos por aluno na educação primária e secundária cresceram 149%, segundo a OCDE. No total, os gastos do país com educação representam 5,5% do PIB, quando o recomendado pelo Plano Nacional de Educação é de no mínimo 6,23%.

Na contramão dos dados, uma pesquisa publicada em 24.03.2014, pelo Instituto Data Popular, em parceria com o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo traz informações preocupantes. De acordo com a pesquisa “Qualidade e Educação nas escolas estaduais de São Paulo”, 46% dos alunos afirmaram terem sido aprovados sem aprender a disciplina. Já 75% dos estudantes e 94% dos pais são contra a aprovação dos alunos que obtiveram notas insuficientes e abaixo do exigido para avançar de série.

O Brasil é uma Ilha
Confrontando as estatísticas sobre o panorama educacional no Brasil com as experiências pessoais vividas na Ilha de Itaparica, é possível identificar relações entre uma escola na praia do município baiano de Vera Cruz e escolas na maior cidade do Brasil, São Paulo. Os dados de aprovação não refletem a qualidade da educação. Sucesso em índices de alfabetização ou de conclusão dos ensinos fundamentais e médio não significa sucesso na formação dos estudantes.

Nota-se, no entanto, que essa crítica é recorrente em diversos países. A busca para se atingir os Objetivos do Milênio, que propõem que até 2015 todas as crianças tenham concluído o ensino básico mas, sobretudo, o desejo de elevar o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que considera o número de matriculados e a não-reprovação, tem feito com que se valorize muito mais as estatísticas, em detrimento da qualidade da educação.

A necessidade do cumprimento de metas tem feito os diversos governos (federal, estaduais e municipais) a forjarem uma realidade, apenas para produzirem números. Entre as Secretarias de Educação e os estudantes, estão as escolas, que se mostram incapazes de superar esse problema. São impotentes para promover tais mudanças, dentro do sistema exigido. E, como se não bastasse, ainda têm o desafio de impedir a evasão escolar e de cumprir o seu papel básico: educar. Os problemas externos, como a pobreza da família dos jovens e o assédio do tráfico de drogas tornam ainda mais complexas as dificuldades enfrentadas pelas escolas, seus diretores, professores e funcionários. O cenário não é muito animador. Nem nas nossas mais belas ilhas!

Fontes:

terça-feira, 15 de abril de 2014

Sociedade civil brasileira se rearticula em torno do FSM

Matéria originalmente publicada pela ABONG.

Créditos: Fora do Eixo


Na última quarta-feira (9 de abril), aconteceu, no Sindicato dos Engenheiros do Estado de São Paulo - SEESP, em São Paulo, seminário de mobilização e articulação das organizações e movimentos sociais brasileiros em torno do processo do Fórum Social Mundial (FSM). O evento reuniu cerca de 40 representantes de organizações e movimentos sociais brasileiros de caráter nacional e/ou que estiveram envolvidos/as em comitês estaduais do FSM e que estão comprometidos com a Carta de Princípios do Fórum. Organizações e movimentos de seis Estados (São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Bahia, Pará e Amazonas) estiveram presentes na ocasião.

Resultado de uma decisão tomada em janeiro deste ano durante o Fórum Social Temático de Porto Alegre, em uma roda de diálogo promovida pelos membros brasileiros do Conselho Internacional (CI) do FSM e que reuniu organizações e movimentos sociais de caráter nacional de diversos Estados do país, o seminário teve como objetivo a mobilização e rearticulação da sociedade civil brasileira em torno do processo do FSM. Mais do que nunca, o FSM e o próprio CI estão desafiados a ressignificar-se numa conjuntura mundial que evoluiu muito desde o surgimento do FSM, em 2001, em Porto Alegre. Esse encontro foi uma oportunidade para participar de um processo avaliativo em curso assim como para refletir e incidir sobre as estratégias de articulação e mobilização dos movimentos sociais no país no processo do Fórum.

Juntamente com Ciranda Brasil, CUT (Central Única dos Trabalhadores) - Brasil, União Brasileira de Mulheres - UBM e União Nacional dos Estudantes - UNE, a Abong compôs a comissão organizadora do evento. Participaram ainda entidades dos movimentos negro, feminista, sindical, de juventude, da democratização da comunicação, entre outras.

O período da manhã foi dedicado à apresentação das entidades presentes. À tarde foi realizada uma ampla avaliação do processo do FSM desde sua primeira edição, em 2001, e um debate em torno dos caminhos futuros do evento global. A reformulação das posições do FSM, visto como importante compromisso para com a causa de oposição ao modelo neoliberal; a proposição de formatos diferenciados do evento; a proposta de regionalização da modalidade e metodologia das discussões do e sobre o FSM; a possibilidade de  inserir novos movimentos (Indignados, na Espanha e movimento Occupy, por exemplo) no processo de discussão do FSM; e críticas à transparência em relação ao CI do FSM foram alguns dos pontos do debate.

Na ocasião, Damien Hazard, diretor executivo da Abong, apresentou os resultados de duas pesquisas em curso, uma de auto-avaliação do CI, e um estudo realizado junto a uma universidade finlandesa aplicada ao CI para dimensionar fragilidades e potencialidades do FSM. Entre as críticas mencionadas pelos membros estão: distância entre as visões do FSM, as aspirações dos/das ativistas e as práticas do CI; dificuldade de inclusão de novos movimentos; necessidade de mais práticas democráticas dentro do CI e de maior diálogo com os movimentos de base; entre outras. Além disso, há críticas sobre a falta de posicionamento do FSM e do CI enquanto organizações, o que fere a Carta de Princípios do Fórum. “Apesar das críticas, há 40 eventos de desdobramentos do Fórum Social Mundial, como fóruns sociais temáticos, regionais e locais, marcados para acontecer em 2014, além do evento global, em 2015, novamente em Túnis”, lembrou Hazard.

Antônio Martins, do site Outras Palavras, avalia que o Fórum sofreu uma perda de repercussão e função que está relacionada a problemas internos do CI e também à modificação da situação da esquerda histórica que passou a fazer alianças com governos, além da pouca inclusão de outros movimentos no processo do Conselho. “A rearticulação do FSM se dará por uma reformulação com novos elementos de simbologia e com a criação e requalificação de novos debates para que se dê mais importância para as reuniões do Fórum. Por isso é fundamental construir uma articulação nova para a agenda do FSM de 2016 que tem muita importância para dar esse novo fôlego para o evento”, avaliou.

Hazard lembrou que o FSM ganhou um novo fôlego no pós crise de 2008 com as edições que aconteceram no norte da África, principalmente no último, que ocorreu em Túnis, na Tunísia, em 2013. “Essa edição trouxe muito da mobilização da juventude e das mulheres da região. Inúmeras novas questões foram colocadas em pauta como a questão do Saara Ocidental e da democracia na região. Além disso, a articulação dos movimentos sociais dali teve muito impacto na Primavera Árabe que culminou em revoluções como a revolução democrática na Tunísia”, salientou.

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Reunião dos Movimentos Sociais brasileiros, dia 09 de Abril em São Paulo

ENCONTRO/ SEMINÁRIO DE MOBILIZAÇÃO E ARTICULAÇÃO
DAS ORGANIZAÇÕES E MOVIMENTOS SOCIAIS BRASILEIROS
EM TORNO DO PROCESSO DOFÓRUM SOCIAL MUNDIAL

09/04/2014 em São Paulo (no SEESP) das 9h às 17h30


Companheiras e companheiros,

Convidamos você(s), representantes de organizações e movimentos sociais brasileiros de caráter nacional e/ou que estiveram envolvidos em comitês estaduais doFórum Social Mundial (FSM), que estão comprometidos com a Carta de Princípios do FSM, a participar de umencontro de mobilização e de (re-)articulação da sociedade civil brasileira em torno do processo do FSM, no dia 9 de abril de 2014 em São Paulo.

A realização desse encontro é o resultado de uma decisão tomada em 23/01/2014, durante o Fórum Social Temático de Porto Alegre, em uma roda de diálogo promovida pelos membros brasileiros do Conselho Internacional (CI) do FSMe que reuniu organizações e movimentos sociais de caráter nacional e de diversos estados do país.

Mais do que nunca, o FSM e o próprio CI estão desafiados a ressignificar-se numa conjuntura mundial que evoluiu muito desde o surgimento do FSM em 2001 em Porto Alegre. Esse encontro será uma oportunidade para participar de um processo avaliativo em curso assim como para refletir e incidir sobre as estratégias de articulação e mobilização dos movimentos sociais no país no processo do FSM.

Reservem esta data em suas agendas, e busquem meios para viabilizar sua participação! 

Onde: SEESP- Sindicato dos Engenheiros no Estado de São Paulo
Rua Genebra, 25, Bela Vista, São Paulo - SP
Perto do Metrô Anhangabaú ( seguir pela saída em frente ao Anhangabaú e atravessar o terminal pela passarela de pedestres)
Mapa : http://www.seesp.org.br/site/localizacao.html

ABONG, CIRANDA, CUT-BRASIL, UBM, UNE
(Comissão organizadora do encontro)

Contatos:
internacional@abong.org.br
leonardovieiracut@gmail.com

A educação no processo de consulta nacional da sociedade civil brasileira sobre agenda pós-2015

Por Damien Hazard
Co-diretor executivo da ABONG – Associação Brasileira de ONGs


Artigo originalmente publicado no "ICAE Virtual Seminar: Education Post 2015".
Para acessar o artigo com traduzido para o inglês, clique aqui. Para acessar a versão em espanhol, clique aqui.



A educação no processo de consulta nacional da sociedade civil brasileira sobre agenda pós-2015
A ABONG – Associação Brasileira de ONGs entrou no processo de discussão da agenda pós-2015 em 2012, por meio de articulações internacionais da sociedade civil latino-americana e planetária. Em paralelo das diferentes modalidades de consultas realizadas pela ONU, redes globais de organizações e movimentos sociais tais como a campanha internacional Beyond 2015, GCAP – Global Call for Action Against Poverty, FIP – Fórum Internacional de Plataformas Nacionais de ONGs e CIVICUS – World Alliance for Citizen Participation, articularam-se de forma independente nesse debate, e promoveram outras consultas nacionais. No Brasil, a Abong- Associação Brasileira de ONGs conduziu esse processo no primeiro semestre de 2013. O resultado, registrado no relatório “O mundo que queremos pós-2015”, disponível no link http://www.abong.org.br/final/download/pospt.pdf (português) e http://www.abong.org.br/final/download/posen.pdf (inglês), foi lançado em agosto 2013. Apresenta um conjunto de recomendações para o governo brasileiro e para as Nações Unidas. Foi entregue na época para os diversos ministérios do governo brasileiro, inclusive para a Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, representante do Brasil no Painel de Alto Nível da ONU.
Para a realização da consulta, a Abong optou pela implementação de uma estratégia em duas fases sucessivas: a primeira de visibilidade e engajamento, cujo objetivo principal foi divulgar a campanha, já que se tratava de assunto pouco conhecido entre organizações do seu campo de atuação. Nesse primeiro momento, foram definidos os princípios que devem nortear a elaboração dos marcos de desenvolvimento pós-2015, a exemplo de:
COERÊNCIA: recuperar compromissos já assumidos pelo Brasil nos tratados e convenções internacionais relacionados ao desenvolvimento, especialmente com relação àqueles assumidos no âmbito do Ciclo de Conferências da ONU na década de 1990.
EFETIVIDADE: assegurar espaço para participação da sociedade civil na implementação, monitoramentoe avaliação do marco de desenvolvimento pós-2015; garantir compromisso político com o financiamento das metas acordadas; garantir que as metas cheguem às questões estruturais que impedem o desenvolvimento.
REPRESENTATIVIDADE: garantir o protagonismo dos segmentos em situação de vulnerabilidade na formação do marco de desenvolvimento pós-2015; fazer uso da capilaridade das organizações e movimentos de defesa de direitos para garantir pluralidade na participação; fazer uso do trabalho já realizado pelos movimentos e organizações em temas afetos à consulta.
A segunda fase consistiu na realização de oficinas temáticas em três grandes cidades brasileiras, de forma articulada com associadas e organizações e movimentos parceiros. As temáticas das três oficinas foram respectivamente: Infância e Juventude (Brasília); Enfrentamento ao Racismo (Salvador); e HIV/Aids e Equidade de Gênero (Recife). No total, 78 organizações, movimentos e redes participaram dessa consulta.
Esse processo de consulta da sociedade civil brasileira não teve como foco específico as questões de educação, mas diversas recomendações incluíram essas dimensões. Uma leitura seletiva do relatório assim permite destacar algumas dessas propostas e destacar problemáticas essenciais para efetivação do direito à educação, e mais especificamente no que diz respeito aos segmentos dos jovens e dos adultos.
A questão da universalização da educação, obviamente, foi apontada como fundamental: “Os novos Objetivos estratégicos do desenvolvimento devem assegurar o acesso universal à educação de qualidade, laica e gratuita, independentemente do sexo, idade, etnia, religião, status socioeconômico, status de imigração, identidade de gênero, orientação sexual, entre outros.”
O acesso à educação deve considerar os grupos mais vulneráveis, a exemplo das pessoas com deficiência, das mulheres, da população negra... Para garantir esse acesso, políticas afirmativas devem ser implementadas, a exemplo das cotas para negros em universidades, ou ainda para aprendizes em empresas e órgãos públicos. De forma geral, a participação e inclusão desses grupos tradicionalmente excluídos supõe uma mudança cultural dentro das instituições. É o que aponta notadamente a seguinte recomendação: “Criar e implementar mecanismos de combate ao racismo e sexismo institucional, incluindo as estruturas de governo com a efetiva participação do movimento negro e demais grupos historicamente fora dos espaços de poder e decisão”.
A valorização da diversidade humana dentro dos espaços e processos educacionais impõe a implementação de conteúdos e metodologias que possam responder a este objetivo. Nesse sentido, há necessidade de “educação com metodologias que integrem pessoas com deficiência e estimulem o seu aprendizado” e ainda “ que a educação atenda às demandas de diferenças culturais: indígenas, comunidades tradicionais, etc.”. A educação assim deve ser entendida como direito cultural e impõe que sejam criadas e implementadas “políticas culturais de afirmação da diversidade e da diferença como mecanismo de enfrentamento e transformação ao ideário de imaginários excludentes”. Dentre essas políticas, devem ser citadas “políticas públicas de preservação e valorização dos sítios e espaços históricos da cultura negra”.
A educação deve abranger diversos campos, a exemplo da nutrição e alimentação adequada, ou ainda da educação sexual. Nesse sentido, os novos objetivos “devem garantir o acesso à juventude de uma educação sexual amigável e ampla (inclusive em espaços além da educação formal), que os permita desafiar normas de gênero nocivas, prevenir-se do HIV e da violência de gênero, da gravidez precoce e não desejada, planejar suas vidas e tomar decisões informadas sobre sua sexualidade”.
A dimensão do acesso à educação também está intrinsecamente ligada ao acesso ao mundo do trabalho, mais do que ao mercado de trabalho, que se concentra apenas nos seus aspectos mais formais. Nesse sentido, é necessário “fortalecer e fomentar paradigmas de um modelo de desenvolvimento que incorpore as formas solidárias de produção e comercialização praticadas por povos e comunidades tradicionais, tais como, populações negras e indígenas, assim como a agroecologia, a preservação do meio ambiente e a defesa de direitos”.
Educação e gestão dos bens comuns também estão ligados. É o que mostra a recomendação sobre a gestão dos recursos hídricos, que considera “que o papel fundamental das mulheres na gestão dos recursos hídricos da comunidade pode ser um ponto de entrada eficaz para programas de educação sanitária e de higiene, que podem ajudar a reduzir a incidência de doenças”.
Educação, participação, diversidade humana, cultura, mundo do trabalho, alimentação, direitos humanos, democracia... Todas essas questões estão ligadas, indissociáveis... Mas as tendências atuais no processo de construção do novo marco de desenvolvimento deixam dúvidas quanto à capacidade dos governos de delinear objetivos interligados e tão ambiciosos quanto os defendidos pelas organizações da sociedade civil, no Brasil e de forma geral no mundo. Infelizmente, o último documento produzido pelo Grupo de Trabalho Aberto da ONU está tentando reduzir o número de pontos em um conjunto de metas de desenvolvimento sustentável. Este documento concentra-se no crescimento como o único fator de desenvolvimento, em detrimento dos direitos humanos e das desigualdades nos países desenvolvidos.
Nessas condições, a sociedade civil planetária vê-se desafiada, mais do que nunca, a aumentar sua pressão sobre os governos e os organismos internacionais.

terça-feira, 18 de março de 2014

Rede de Cozinhas Solidárias marcou presença no carnaval de Salvador!

Mais um carnaval chegou ao fim. Em 2014, quem comandou a folia em Salvador foi o “Lepo Lepo”, o Psirico, os foliões e, claro, os trabalhadores e trabalhadoras que fazem a festa acontecer. Pelo décimo primeiro ano o Eco Folia Solidária se fez presente, valorizando o trabalho dos catadores e catadoras de material reciclável. E, junto com ele, o projeto Rede de Cozinhas Solidárias, que envolveu os grupos Tempero do Quilombo, 13 de Junho, além da Rede de Alimentação, formada por ADOCCI, COOFE, COOPAED, Guia de Luz e Sonhos Possíveis.



Durante o carnaval, o Complexo Cooperativo de Reciclagem da Bahia (CCRB) coordenou o Eco Folia Solidária, que foi responsável por mobilizar cerca de 1.300 catadores, que coletaram mais de 70 toneladas de materiais recicláveis. O CCRB foi responsável pela compra desses materiais, a um preço acima do mercado, evitando atravessadores e valorizando os trabalhadores. Além disso, nos cinco núcleos montados nos percursos do carnaval, foi feito o cadastro dos catadores e catadoras, além da distribuição de equipamentos de segurança (luvas, camisas, botas, protetores auriculares) e três alimentações diárias.

Quem ficou responsável pela produção dos alimentos foram, justamente, os grupos participantes do projeto Rede de Cozinhas Solidárias. Durante todo o carnaval, 110 profissionais, sendo 83 mulheres, dos 7 grupos envolvidos, se revezaram na produção. Foram preparados diariamente café da manhã, almoço e jantar, distribuídos para os catadores e catadoras participantes do Eco Folia Solidária. Da quinta de carnaval à noite, até a manhã da quarta-feira de cinzas, foram produzidas 22 mil quentinhas.



Além de contribuir para a festa e para a valorização do trabalho dos catadores e catadoras, a participação no Eco Folia Solidária também significou geração de renda para os grupos ligados ao projeto Rede de Cozinhas Solidárias. A oportunidade de trabalhar no carnaval significou um acréscimo de 30% na renda média das trabalhadoras. Ainda assim, os grupos destacaram uma queda no rendimento, em comparação com o ano passado. De acordo com Conceição, cooperada da COOFE, “o recurso foi menor e os cultos mais elevados”. Já Dinha, da cooperativa Sonhos Possíveis, afirmou que “mesmo diminuindo os recursos, esse ano foi mais organizado, sem confusão. Valeu à pena!”.

As trabalhadoras dos empreendimentos também destacaram a contribuição da Associação Vida Brasil na viabilização do projeto. Débora Rodrigues, coordenadora do programa de Economia Solidária da Vida Brasil apontou o fato de que o Eco Folia “afirma a Economia Solidária como alternativa importante no processo de inclusão econômica dessa população composta, sobretudo, por mulheres negras”. Para Ana Suely, do grupo ADOCCI, “A parceria da Vida Brasil foi muito importante. Ajudou na logística, deu apoio na prestação de serviços das nutricionistas e no estudo de viabilidade”. Janice, da COOFE, complementou: “O estudo de viabilidade foi fundamental para regrar cada centavo. Se não fosse isso, não daria certo”.




Agora, os empreendimentos estão finalizando o processo de avaliação da participação no Eco Folia Solidária 2014. Já o projeto Rede de Cozinhas Solidárias, executado pela Vida Brasil, segue em andamento, mobilizando e apoiando novos empreendimentos de Economia Solidária, no ramo da Alimentação. O projeto conta com o financiamento da Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza da Governo do Estado da Bahia, através do programa Vida Melhor.

Confiram o vídeo do processo de produção, clicando aqui.

Confiram o álbum de fotografia, clicando aqui.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

O bloco Buscapé não desfilará no Carnaval 2014


Assim como no ano passado, novamente o Bloco Buscapé não desfilará no carnaval de Salvador. É a segunda vez, nos 17 anos de projeto, que as ruas do Pelourinho deixarão de contar com o desfile do Buscapé.

Já há alguns anos, o bloco vem encontrando dificuldades de ir para a rua, sobretudo em um carnaval cada vez mais privatizado, cujas prioridades são os grandes empreendimentos comerciais, os grandes blocos, artistas e camarotes. A burocracia dos editais não contempla o tipo de projeto desenvolvido pelo Buscapé e o diálogo com os órgãos públicos foi infrutífero. Nos últimos anos realizamos uma mobilização por recursos com amigos e parceiros que, voluntariamente contribuíram da forma que podiam. Esse ano, após discussão, decidimos rejeitar a opção de irmos novamente com o pires na mão bater na porta dos gestores públicos.

Na reunião realizada no dia 5 de fevereiro, com a presença das organizações da coordenação, de educadores mas também de jovens do projeto, decidimos buscar um novo tipo de ação. A proposta encaminhada foi de realizarmos um encontro pós-carnaval, para retomarmos a mobilização interna como todas as entidades e indivíduos que sempre colaboraram com o Buscapé e traçarmos estratégias para serem executadas durante todo o ano, para que tenhamos mais perspectivas de voltarmos a desfilar no carnaval de 2015.

Lamentamos profundamente a ausência do Buscapé no sábado de carnaval. Temos certeza que esse sentimento é compartilhado pelas mais de 20 organizações e grupos comunitários de Salvador e região metropolitana; pelas centenas de pais, mães, crianças e jovens; pela banda Purificaiyê, de Irará; pelas entidades que coordenam o Buscapé: Vida Brasil, CRPD das Obras Sociais Irmã Dulce, Cama e OIMBA; pelas escolas que abriram as portas para o projeto Buscapé durante o ano; e para os foliões que durante 15 anos tiveram a oportunidade de ver e participar de um dos blocos mais democráticos do carnaval de Salvador. Um bloco que reunia crianças, adolescentes e jovens de diversos bairros populares, incluindo pessoas com deficiência e pessoas em conflito com a lei, que sempre foram historicamente excluídos dessa grande festa originalmente popular, mas que a cada ano perde essa sua principal característica.

De um lado fica a tristeza, mas por outro, fica a certeza de que devemos e temos condições de reverter esse quadro. Com muito trabalho e colaboração de todos, vamos planejar esse ano, para que em 2015 as ruas do Centro Histórico possam voltar a ter o brilho e a alegria que são a marca do Bloco Buscapé.

Atenciosamente,
Coordenação do Bloco Buscapé

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Por onde anda o Fórum Social Mundial?


Entre os dias 24 e 29 de janeiro de 2014, foi realizado o Fórum Social Temático, em Porto Alegre, com o título "Crise capitalista, democracia, justiça social e ambiental". Damien Hazard, coordenador da Vida Brasil e diretor executivo da Abong participou das atividades e assina, junto com Mauri Cruz (diretor estadual da Abong no Rio Grande do Sul), o seguinte editorial, intitulado "Por onda o Fórum Social Mundial?".

Damien Hazard (Vida Vrasil) durante o FSTemático

Por onde anda o FSM?

Os últimos meses foram frutíferos no que diz respeito ao processo do Fórum Social Mundial (FSM). Obviamente, esses fatos não receberam a devida atenção por parte da mídia comercial que, por exemplo, sufocou o noticiário com o Fórum Econômico de Davos no final de janeiro, mas nem sequer citou o Fórum Social Temático 2014 (FSTemático 2014), realizado em Porto Alegre no mesmo período, cujo tema este ano foi “Crise capitalista, democracia, justiça social e ambiental”. O fato é que o FSM continua na boca e na mente dos movimentos sociais de todo planeta. Seus rumos suscitam debates e questionamentos, mas também críticas, inclusive por parte de intelectuais e militantes saudosos/as dos primeiros fóruns ou descrentes sobre a capacidade do FSM em resignificar-se na nova conjuntura mundial.

O FSM evoluiu muito desde que foi lançado, 13 anos atrás. Naquela época, Porto Alegre surgiu como cidade da resistência, quase que única barricada a se erguer contra o pensamento único neoliberal dominado pelo sistema financeiro internacional, ousando defender a ideia de que outro mundo era possível. A partir daí, o FSM multiplicou-se pelo planeta, desdobrando-se em fóruns nacionais, regionais, locais e temáticos.

Assim como o FSM, o mundo de 2014 guarda pouca semelhança com o mundo de 2001. No seminário promovido pela Abong na abertura do FSTemático 2014 no dia 22 de janeiro sobre crise capitalista e agenda pós-2015, o francês Bernard Cassen lembrou que, em 2001, as ideias e propostas do FSM eram somente isso, ideias e propostas. Não havia sequer um governo que tivesse experimentado sua eficácia. Hoje, há várias experiências não só na América Latina, mas também na África e na Europa, que implementaram as propostas sustentadas pelos movimentos do FSM em várias áreas, seja da economia popular, dos direitos sociais ou mesmo da participação popular. Qual deve ser o papel da sociedade civil organizada neste novo contexto? Defender estas políticas públicas e avaliar sua eficácia? Consolidar as propostas, monitorar as políticas e aprofundar as mudanças? Aqui reside uma questão chave: a relação dos processos e das organizações do FSM com as dinâmicas de poder, seja nacional em relação aos governos, seja internacional em relação aos espaços multilaterais de governança global.

No Brasil, muitas organizações e movimentos sociais estiveram envolvidos, na última década, em processos de articulação e de construção de fóruns sociais. Depois da última edição mundial no Brasil, em 2009, na cidade de Belém (PA), o FSM foi para a África, primeiro para Dacar, no Senegal, em 2011, e no ano passado, em março de 2013, para Túnis, na Tunísia. Em muitos aspectos, a dinâmica da sociedade civil brasileira em torno do FSM diminuiu nos últimos anos, a não ser em algumas cidades e regiões, a exemplo de Porto Alegre e da região panamazônica. Já não há mais uma articulação nacional de organizações ou comitês estaduais do FSM.

Trazer o FSM novamente para o Brasil, como sugerem alguns, não é a solução. O FSM desenvolveu-se numa região do mundo onde a efervescência da sociedade civil permitiu reunir uma parte expressiva de novos atores mundiais de oposição ao neoliberalismo. A última edição mundial do evento em Túnis deu um novo fôlego para o FSM, com a participação da juventude, das mulheres, da população tunisiana e dos diversos povos da região, assim como de movimentos vindos de todos os continentes, dentre os quais, uma representação brasileira que permaneceu expressiva. O FSM 2013 permitiu dar maior visibilidade às lutas dos movimentos sociais da região, que por sua vez, viram seu papel fortalecido na geopolítica local, a exemplo do próprio contexto tunisiano. Por isso, durante a sua última reunião, ocorrida em Casablanca, no Marrocos, entre 16 e 18 de dezembro passado, o Conselho Internacional do FSM, do qual a Abong é membro, tomou a decisão de realizar o próximo FSM novamente em Túnis, em março de 2015. No ano seguinte, em agosto de 2016, acontecerá a primeira edição mundial do evento num país do “Norte”: em Montreal, no Canadá. Os dois processos de construção, na Tunísia e no Canadá, devem acontecer de forma integrada.

As organizações e movimentos brasileiros continuam exercendo um papel importante no processo do FSM, e contribuem para manter viva e acesa a agenda anti-Davos, gritando ao mundo de forma explícita que parte significativa da população do planeta posiciona-se contra o modelo capitalista vigente que financia guerras, gera milhões de refugiados, miséria, fome, desigualdade e caos ambiental, penalizando principalmente as crianças, os/as jovens, as mulheres, as populações não-brancas e os/as trabalhadores/as de todos os continentes. É o que mostrou, por exemplo, a Cúpula dos Povos, realizada em junho de 2012, em paralelo ao evento oficial Rio+20, e que conseguiu mobilizar multidões de organizações e movimentos, realizar debates e produzir posicionamentos convergentes, críticos e propositivos de alta qualidade e relevância. Ou ainda o FSTemático 2014, ao reunir mais de 5 mil militantes sociais em Porto Alegre entre 21 a 26 de janeiro com 17 atividades de convergência e a presença de cerca de 300 convidados internacionais de 40 países. Muito mais do que pela quantidade, o FSTemático 2014 foi significativo pela qualidade de seus debates e de seus encontros e articulações possibilitadas, assim como por sua diversidade preservada. Houve mais de 300 atividades autogestionadas ligadas às temáticas da educação formal, da educação popular, das lutas LGBT, às denúncias de violência contra a juventude negra da periferia, aos direitos das mulheres, à crise urbana, à violação dos direitos humanos resultado do modelo neodesenvolvimentista, à demarcação dos territórios indígenas e quilombolas, à cultura como direito humano ou ainda à democratização dos meios de comunicação expressos no Fórum Mundial de Mídia Livre.

O FSTemático 2014 também significou um passo na rearticulação dos movimentos e organizações sociais brasileiras. Foi realizada uma reunião representativa de todas as redes e movimentos sociais brasileiros presentes em Porto Alegre e o acordo da realização de uma grande atividade conjunta em março próximo na cidade de São Paulo para a reconstrução de um Comitê Brasileiro. Esta será uma primeira reunião ampla para rearticular todos e todas que se identificam com a Carta de Princípios do FSM e que abrirá um calendário de outras reuniões similares nas demais regiões do país preparando a atuação brasileira no contexto nacional, latino-americano e mundial.