segunda-feira, 15 de junho de 2015

A Vida Brasil na Guiné Bissau: contribuindo para o fortalecimento da democracia

Por Damien Hazard

Cinco dias já se passaram aqui na Guiné Bissau. É a terceira vez que venho, a primeira há exatamente um ano, quando fui convidado pela Liga Guineense de Direitos Humanos e pela organização portuguesa ACEP para participar de um encontro da sociedade civil do país e apresentar, em nome da Abong- Associação Brasileira de ONGs, a dinâmica da democracia brasileira. Naquela época, o país ainda estava dirigido pelos militares, depois de um golpe em 2012, mas eleições presidenciais tinham sido organizadas alguns meses antes e os militares tinham perdido a disputa nas urnas. A população guineense estava na perspectiva da chegada de um novo regime, desta vez democrático. Lembro que o futuro primeiro ministro (agora investido) estava presente no evento, assim como diversas lideranças de movimentos sociais do país. É neste evento que conheci Spencer Gomes, um dos diretores da Federação de Associações de Defesa e Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência de Guiné Bissau. Alguns meses depois, fui chamado pela Handicap International para desenvolver e redigir, junto com a Federação, um projeto de promoção da educação inclusiva em Bissau. O projeto foi apresentado para União Europeia e acabou sendo apoiado. Começou inclusive no início do mês de maio deste ano.



De volta esta semana no país africano, a convite da Federação e da Handicap International (Senegal-Cabo Verde), chego num novo contexto. O regime democrático está instalado há quase um ano. Segundo os militantes da Liga Guineense de Direitos Humanos e da Casa de Direitos, tudo indica que o atual regime conseguirá ir até o final do seu mandato. Enquanto defensores de direitos humanos, eles não estão mais perseguidos ou obrigados a viver escondidos. Ou seja: a democracia está em marcha, está sendo construída. Por isso, o trabalho que estou fazendo nesses dias, de facilitação para concepção de um projeto de fortalecimento do movimento de pessoas com deficiência no país, revela-se de extrema importância. E é obviamente, muito gratificante, para mim e para Vida Brasil que estou representando aqui.

Estou descobrindo e aprendendo a cada dia, trocando experiências e ideias, fortalecendo valores humanos e alimentando esperanças e utopias. Depois de 4 dias em Bissau, capital do país, fui pro interior ontem, sábado, nas regiões de Oio e de Cacheu. É na região de Cacheu que começou, em 1446, a colonização portuguesa. Vi a primeira igreja católica construída no país, o Forte de Cacheu (o primeiro da região) edificado em 1588 e a praia de onde saíram os primeiros africanos da região, escravizados. Me disseram que foi daqui que saiu Kunta Kinte, capturado na Gambia, e cuja história tornou-se famosa no livro Raízes Negras, do autor Alex Haley.

Forte de Cacheu


Além de organizações de direitos humanos, com quem já estávamos em contato, também conheci várias associações, de pessoas surdas, cegas, com deficiência física, ou ainda de apoio à inclusão escolar... E devo ainda conhecer outras nos próximos dias, a exemplo da Associação de Albinos de Guiné Bissau, um contato que, tenho certeza, será muito interessante para nossa parceira Apalba, primeira e pioneira associação no Brasil de pessoas com albinismo.

Acho importante ressaltar a importância do Brasil e das suas possíveis contribuições para o mundo e principalmente para dos países de língua portuguesa. O Brasil tornou-se, nos últimos dez a quinze anos, uma referência para muitos desses países e dos seus povos, inclusive no processo de construção da democracia e de implementação de políticas públicas de inclusão social. Há riscos nessa influência, obviamente, em relação ao papel exercido por grandes empresas transnacionais de origem brasileira. China, Brasil e Portugal constituem-se aqui como os principais parceiros do país para suas políticas de desenvolvimento econômico. E pelo visto, desenvolvimento econômico não significa necessariamente desenvolvimento social e ambiental. Assim como em Angola e Moçambique, essa atuação precisa ser monitorada e regulada, e a sociedade civil organizada poderia e deveria ter um maior papel nesse sentido.

Praia em que saíam os homens e mulheres escravizados


Há grandes possibilidades de colaboração entre Brasil e Guiné Bissau para construção e promoção da equidade e da justiça social e ambiental. É bom saber disso, e talvez seja mais fácil percebê-lo quando está mais distante. Deve-se reconhecer que a sociedade guineense tem muito mais consciência disso do que a sociedade brasileira. 

Nesse sentido, é preciso reconhecer os avanços sociais obtidos nos últimos anos no Brasil e que estão sendo invisibilizados na grande mídia de forma alienadora e muitas vezes retrógrada, num processo de desinformação preocupante, onde países africanos, como Guiné Bissau, são sequer citados em notícias.

Escola de surdos

versão em francês

Vida Brasil en Guinée-Bissau: contribution pour le renforcement de la démocratie

Cinq jours se sont passés ici en Guinée Bissao. C´est la troisième fois que je viens, la première il y a exactement un an, lorsque je fus invité par la Ligue Guinéenne des Droits de l'Homme et par l'organisation portugaise ACEP pour participer à une rencontre de la société civile du pays et présenter, au nom de Abong- Association brésilienne des ONG, la dynamique de la démocratie brésilienne. À cette époque, le pays était encore dominé par l'armée, qui avait pris le pouvoir en 2012 après un coup d'Etat, mais les élections présidentielles , réalisées quelques mois avant, le lui avaient retiré. La population guinéenne attendait l'arrivée d'un nouveau régime, cette fois démocratique. Je me souviens que le futur premier ministre (désormais investi) était présent lors de l'événement, ainsi que plusieurs dirigeants des mouvements sociaux du pays. J´avais notamment connu Spencer Gomes, directeur de la Fédération de défense et de promotion des associations des droits des personnes handicapées de Guinée Bissao. Quelques mois plus tard, je fus invité par Handicap International pour développer et écrire, avec la Fédération, un projet de promotion de l'éducation inclusive à Bissau. Le projet avait été présenté à l'Union européenne et finalement appuyé. Il a d´ailleurs commencé ?au mois de mai dernier.

De retour cette semaine dans le pays africain, à l'invitation de la Fédération et de Handicap International (Sénégal, Cap-Vert), je suis arrivé dans un nouveau contexte. Le régime démocratique est en vigueur depuis près d'un an. Selon les militants de la Ligue guinéenne des droits de l'homme et de la Maison des droits (Casa dos Direitos), le gouvernement actuel sera capable de mener son travail jusqu´à la fin de son mandat. Les défenseurs des droits humains ne sont plus persécutés ou obligés de vivre dans la clandestinité. En d'autres termes, la démocratie est en marche, elle est en cours de construction. En ce sens, le travail que je fais ces jours-ci, consistant à faciliter la conception d´un projet de renforcement du mouvement des personnes handicapées dans le pays, se révèle d'une grande importance. Il est également très gratifiant pour moi et pour Vida Brasil, que je représente ici.

Je découvre et j´apprends tous les jours, dans l'échange d'expériences et d'idées, en renforçant des valeurs humaines et en alimentant les espoirs et les utopies. 

Après 4 jours à Bissau, capitale du pays, je suis allé dans les provinces, samedi, et plus exactement dans les régions de Oio et de Cacheu. C´est dans la région de Cacheu qu´a commencé, en 1446, la colonisation portugaise. J'ai vu la première église catholique construite dans le pays, mais aussi le Fort de Cacheu (le premier dans la région), construit en 1588, ou encore la plage sur le Rio Cacheu, d´où les premiers Africains de la région réduits à l´esclavage sont partis. On m'a dit que c´est de là qu´est parti Kunta Kinté, capturé en Gambie, et dont l'histoire a été rendu célèbre dans le livre Racines, de l´auteur Alex Haley. 

En plus des organisations des droits humains, avec qui nous étions déjà en contact, J´ai aussi rencontré plusieurs associations, de personnes malentendantes, malvoyantes, avec un handicap physique, ou de promotion de l'éducation inclusive... Et j´en connaitrai d´autres dans les prochains jours, comme l´Association des Albinos de Guinée Bissao, un contact qui, j´en suis sûr, sera très intéressant pour notre partenaire Apalba, première et pionnière association au Brésil de personnes atteintes d'albinisme. 

Je profite pour souligner l'importance du Brésil et de ses éventuelles contributions pour le monde et en particulier pour les pays lusophones. Le Brésil est devenu dans les dix à quinze dernières années, une référence pour un bon nombre de ces pays et de leurs peuples, dans le domaine de la construction de la démocratie et de la mise en œuvre de politiques publiques d'inclusion sociale. Il y a évidemment des risques dans cette influence, avec notamment le rôle joué par les sociétés transnationales originaires du Brésil.

Chine, Brésil et Portugal constituent ici les principaux partenaires du pays pour ses politiques de développement économique. Et apparemment, développement économique ne signifie pas nécessairement développement social et environnemental. Comme en Angola et au Mozambique, cette action doit être surveillée et réglementée, et la société civile organisée pourrait et devrait jouer un rôle plus important à cet égard. 

Il ya de grandes possibilités de collaboration entre le Brésil et la Guinée-Bissau pour la construction et la promotion de l'équité et de la justice sociale et environnementale. C´est bien de le savoir, et il est plus facile de le percevoir quand on est plus loin. Il faut reconnaître que la société bissao-guinéenne a beaucoup plus conscience de cela que la société brésilienne. En ce sens, il est important re reconnaître les progrès réalisés ces dernières années au Brésil, mais qui semblent invisibles dans les grands médias brésiliens, qui agissent de façon aliénée et trop souvent rétrograde, à travers un processus de désinformation préocupant, dans lequel les pays africains, à l´exemple de la Guinée Bissao, ne sont jamais cités.

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